segunda-feira, 23 de julho de 2012

É um pequenino …adorável...

Bouguereau The joys of motherhood

“Diddle, diddle…dum…onde foi ele buscar estas pernas maravilhosas?”…Disse a mãe extasiada “…É um pequenino …adorável, é o que ele é; e tem as perninhas cor-de-rosa mais bonitas do mundo…” (H. Kohut).

Este brincar gostoso que é repetido vezes sem conta e que se torna aditivo - quanto mais se dá mais vontade há em dar. O gozo é mútuo. É o vaivém das boas interações humanas. Quem o provou, não consegue imaginar que tipo de pessoa se poderia ter tornado, caso não tivesse vivido a experiência primordial de ser aceite de um modo prazeroso e incondicional.  
Assim se aprende a amar e a gostar como um jogo afetuoso (D. Winnicott), no qual se experimenta a confiança no adulto que brinca com a criança. A amar aquilo que faz a gente sentir-se amado, e consequentemente, a desenvolver expetativas de que se merece sê-lo.
Se desvalorizamos a importância destes jogos amorosos, aqui fica a texto que se segue ao diálogo mãe – filho:
“As minhas próprias investigações indicam que com frequência este processo parece ter corrido mal na infância dos indivíduos destinados a sofrerem mais tarde perturbações da personalidade narcísicas e borderline. Os pacientes deste tipo pensam que não foram, atual ou retrospetivamente, desejados ou que foram adotados; que as suas mães experimentaram devido ao seu nascimento coisa “ terríveis” fazendo com que decidissem nunca mais ter outros filhos; que são responsáveis pela depressão pós-parto das mães ou pelo fato de o pai se ter ido embora. Tudo isto sugere um si-próprio narcísico precocemente frustrado."
Jeremy Holmes Narcisismo Almedina

O negativismo

Geraldine Javier Storm Chasing Dog Chasing Girl Chasing Storm 1970

"Quando a raiva narcisista não se pode manifestar abertamente, aparece, às vezes, sob uma forma particular de reafirmação do sujeito, o negativismo. Já em outro lugar, havíamos colocado que o sujeito podia chegar a opor-se a seu próprio desejo para que não satisfizesse o do outro.
….
Podemos agora completar aquela descrição, assinalando que quando se deseja que o desejo do outro não se satisfaça é porque se entrou numa luta narcisista sobre quem é o dono do desejo, o sujeito ou o outro. Mediante o negativismo, adquire-se o sentimento de ser quem manda, quem não se submete ao domínio do outro.
No negativismo, é necessário procurar sempre a ferida narcisista, o vivido como ofensa que se quer estancar através daquela conduta. Por isso, é particularmente frequente e intenso na adolescência, na qual o sujeito sente-se tão inseguro, podendo cumprir, quando não é excessiva, uma função estabilizadora do equilíbrio narcisista e, portanto, constituir uma fonte de crescimento. A partir dessa perspetiva, o negativismo será tanto mais forte quanto mais a autoestima esteja questionada, seja a partir do exterior – por falta de figuras significativas -, seja a partir do próprio sujeito.”
Hugo Bleichmar O Narcisismo Artes Médicas
O negativismo sendo uma defesa perante a ansiedade, pode ser identificado pela atitude que na linguagem popular se traduz por “estar sempre do contra”, que de acordo com o tipo de pessoa, mais sofisticada ou menos sofisticada, se expressa por diversas formas. Mas todas elas significam a dificuldade em segurar o que se sente de bom (Rita Mendes Leal), e que vem do outro. É o contrário do impulso de vida, por atacar o laço que podia unir as pessoas, mas que se pode manter por conceder um sentimento de poder.


quinta-feira, 19 de julho de 2012

Carlos Amaral Dias na Antena 1


O psicanalista Carlos Amaral Dias conversa com Margarida Mercês de Melo, no programa Janela Discreta na Antena 1. Estão disponíveis 8 conversas em:
http://www.rtp.pt/programa/radio/p5257

imagem reirada da net

terça-feira, 17 de julho de 2012

O lugar e o papel esperados

Josef Fischnaller

A propósito das declarações de D. Januário Torgal Ferreira sobre os políticos corruptos, fiquei a pensar se as mesmas seriam uteis para a nossa vida pública, porque são generalistas. 
Para além da opinião que possamos ter, a mãe de todas as verdades da política está no texto que se segue, cuja ideia geral é - o poder, só tem o poder que a gente quer - o que remete para a nossa vigilância e luta pelo aperfeiçoamento das condições de controlo dos atos políticos. Para nos precavermos. Não esquecendo que os responsáveis pela situação em que nos encontramos, são os que estão no topo das organizações privadas e públicas.
“M. Berger pensa que os homens de estado são narcísicos.
Modularei o seu ponto de vista, dizendo que não é a pessoa do político que convém designar de narcísica; é a função que cria as condições favoráveis para que ele o seja, a partir dos seus traços de personalidade. Toda a nação o deseja inconscientemente. Se os políticos gostam tanto de conduzir, é também porque nós sobrevalorizamos essa tarefa. O que conta aqui é o lugar e o papel esperados e não o desejo individual, diria um terapeuta de grupo.”
Alberto Eiguer Pequeno Tratado das Perversões Morais Vértices




segunda-feira, 16 de julho de 2012



Aqui está uma coisa que me faz sempre feliz quando olho para ela: a calçada madeirense dos quintais, com pedra (inteira) do mar. Se o meu pensamento resvalar para ações de particulares e de entidades com responsabilidade que optam por substituir esta calçada por tijoleira moderna ou cantaria, fico logo infeliz. 

sábado, 14 de julho de 2012

Dar-se ao respeito


Francesco Guarino Santa Ágata

"O sentimento de direito, a satisfação de ter razão, a alegria de nos estimarmos a nós próprios, são, caro senhor, molas poderosas para nos sustermos de pé ou nos fazer avançar. Pelo contrário, privar disso os homens é transformá-los em cães raivosos.”
Albert Camus A Queda
E assim deve ser. “A todas as mulheres para que não tenham medo e se deem ao respeito”, comentário de uma mulher à saída do Tribunal, onde o marido foi acusado  e condenado por violência doméstica. A mulher compreendeu que só ela seria capaz de crescer e mudar. O medo, a existir, ficou abaixo da superfície, esmagado. Compreendeu também, que é um ser sagrado e que o outro não tem direitos de atentar contra essa essência. É a altivez necessária. A alegria de se estimar a si própria.
Vale a pena ler “O poder das palavras” de Sandra L. Brown em:
 http://saferelationshipsmagazine.com/sandra-says

terça-feira, 10 de julho de 2012

O ressentimento #2

Judith Beheading Holofernes Caravaggio

“Detenhamo-nos em outra forma de reafirmação narcisista. Em muitas circunstâncias, quando um sujeito briga com outro, tenta reforçar seu desgosto através de uma atitude que bem poderíamos qualificar de cultivo do ressentimento. Obtém um prazer especial em manter-se irritado e rejeitar o outro. Graças a esse cultivo do ressentimento, o sujeito reafirma-se em sua razão perante o outro, situando esse no lugar de culpável e, correlativamente a si mesmo, no de condenado. Consegue ocupar a posição narcisista privilegiada de ser aquele que rejeita o outro. O frequente sentimento de superioridade que o sujeito mostra no momento do ressentimento denuncia a sua função narcisista.”
Hugo Bleichmar O Narcisismo Artes Médicas
Para aquele que entrou pelas nossas fronteiras e se portou como um ladrão, a dor de início parece não vir de nenhum lugar, e continuar soa possível. Com o tempo, qualquer pequena coisa a convoca. É dormente e demorada. Nesta obscuridade, não se encontra maneira de tomar um rumo. Espreita a perda do sentido de quem somos. Com a coragem de sobreviver e se não houver medo de encarar o desespero, passada esta fase, assume-se a injúria de frente. Pode não ser a melhor condição de existência, mas chegamos enfim, a uma terra habitável. Com este chão, vem um sentimento de controlo e quem sabe, se chegue a perdoar, quem não experimentou ou percebeu o elementar.

Deixo-vos um enxerto de Anne Alvarez* sobre o ressentimento no romance A Brincadeira de Kundera:" (Um amigo que lhe traiu e fez com que ele fosse mandado para uma colônia penal por quinze anos). Ele pergunta: "Como explicaria que não podia fazer as pazes com ele?"...e, "Como poderia explicar que usava meu ódio para contrabalancear o peso do mal que carregava quando jovem...Como eu explicaria que precisava odiá-lo."


* Malignidade sem motivo: problemas na psicoterapia de pacientes psicopatas.

sexta-feira, 6 de julho de 2012

A ilusão necessária

Carlos Amaral Dias*: “Daí o nascer da ilusão amorosa. Sem esta ilusão, impossível o amor…Genialmente o diz Eugénio de Andrade (neste poema)
gastámos as palavras pela rua, meu amor,
e o que nos ficou não chega
para afastar o frio de quatro paredes.
Gastámos tudo menos o silêncio.
Gastámos os olhos com o sal das lágrimas,
gastámos as mãos à força de as apertarmos,
gastámos o relógio e as pedras das esquinas
em esperas inúteis.

Meto as mãos nas algibeiras e não encontro nada.
Antigamente tínhamos tanto para dar um ao outro;
era como se todas as coisas fossem minhas:
quanto mais te dava mais tinha para te dar.
Às vezes tu dizias: os teus olhos são peixes verdes.
E eu acreditava.
Acreditava,
porque ao teu lado
todas as coisas eram possíveis.

Mas isso era no tempo dos segredos,
era no tempo em que o teu corpo era um aquário,
era no tempo em que os meus olhos
eram realmente peixes verdes.
Hoje são apenas os meus olhos.
É pouco mas é verdade,
uns olhos como todos os outros.

gastámos as palavras.
Quando agora digo: meu amor,
não se passa absolutamente nada.
E no entanto, antes das palavras gastas,
tenho a certeza
de que todas as coisas estremeciam
só de murmurar o teu nome
no silêncio do meu coração.

Não temosnada para dar.
Dentro de ti
não há nada que me peça água.
O passado é inútil como um trapo.
Ete disse: as palavras estão gastas.

Adeus.
*Carlos Amaral Dias A Geneologia da Amor: Vinculação ou Ilusão Vinculativa, Revista Portuguesa de Psicanálise, 3 Ed. Afrontamento




Adeus, d'Eugénio de Andrade from blocsdelletres on Vimeo.


terça-feira, 3 de julho de 2012

Da transcendência

Joanathan Mak

“…a moral endógena e autónoma decorrente da empatia e compaixão, é válida e nobre. É com ela que nos transcendemos, vamos para além de nós próprios, cumprimos a missão de mudar o mundo para melhor – e com isso ultrapassamos, em parte, a humana angústia existencial (perante a consciência da finitude da vida) e alcançamos alguma imortalidade simbólica …”.
António Coimbra de Matos Relação de Qualidade, Penso em Ti Climepsi
A bondade é um estado de espírito que requer capacidade de relacionamento com pessoas reais e com as suas necessidades. Com as suas atitudes naturais,quem assim procede ajuda a que as coisas se encaminhem para melhor. Ao dar, confiam que recebem refletido na marca que deixaram no outro e no mundo, como que pedacinhos de si que passarão a existir para além da sua habitual sobrevivência. Pelo que, não compreendem quem possa viver a pensar apenas em si próprio, sobretudo se este resiste a não deixar que o outro se encaixe na sua vida. Este vazio deixa-os profundamente tristes, porque de alguma forma se deveria estar para os outros. Mas são salvos pelo seu pragmatismo.

domingo, 1 de julho de 2012

Felicidade para Hitchcock


É uma receita simples para a felicidade. Elimine todas as emoções negativas, qualquer coisa que cria sentimentos ruins e desvia-o do projeto em mãos.
Limpar tudo , e o que resta? O espaço para a criatividade pura e simples. Isto é felicidade para Hitchcock.